José Salvação
Lá está ele outra vez, acomodado num avião, sobrevoando a miséria que deixou para trás. Surpreendidos? Eu não!
O Presidente da República, José Ramos-Horta, volta a fazer as malas, pronto para mais uma das suas “visitas de trabalho”, aquelas que nunca podem ser questionadas, nem sequer avaliadas pelos seus reais benefícios para o país. Desta vez, o destino é Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, onde irá participar na pomposa "Cimeira da Fraternidade Humana". Um evento que promove o diálogo e a irmandade num cenário de ouro e mármore, enquanto a verdadeira fraternidade, a do povo timorense, continua a ser feita de fome, sofrimento e abandono.
O ponto alto da cimeira será a entrega do Prémio Zayed para a Fraternidade Humana, um reconhecimento a indivíduos que fizeram "grandes sacrifícios" pela paz e solidariedade. Sacrifícios? Será que viajar em primeira classe, dormir em hotéis de cinco estrelas e degustar menus exclusivos se encaixa nessa definição? Enquanto Ramos-Horta brinda com a elite mundial, os timorenses fazem filas nos hospitais sem medicamentos, lutam por um prato de comida e enterram os seus mortos sem a dignidade que merecem.
O evento reunirá líderes políticos e laureados com o Nobel, que discutirão os "grandes desafios globais". Entre esses desafios, talvez a principal preocupação seja: "Quando será a próxima viagem?" Porque os desafios do povo timorense são outros — como sobreviver à miséria diária, como dar de comer aos filhos, como tratar uma doença quando os hospitais não têm sequer um analgésico para aliviar a dor.
Enquanto Ramos-Horta ergue talheres de prata no luxuoso jantar "Tapeçaria da Humanidade", no Palácio dos Emirados, em Timor, uma mãe chora porque não tem como alimentar o filho. Solidariedade real não se discursa em conferências internacionais — pratica-se na terra onde o povo sofre. Se há dinheiro para pagar estadias de luxo e passagens de primeira classe, por que não há para garantir serviços básicos aos cidadãos?
"Timor-Leste sente-se honrado por participar neste encontro significativo, que incorpora os valores que defendemos, paz, diálogo e compreensão mútua", declarou Ramos-Horta. Será? Quando é que essa compreensão mútua chegará às ruas de Díli, onde crianças sofrem de raquitismo e hospitais funcionam sem condições? Quando a “paz” deixará de ser um conceito abstrato para se tornar uma realidade para aqueles que vivem diariamente o inferno da pobreza?
Ironia? Não, tragédia. Enquanto Ramos-Horta é recebido com tapetes vermelhos e discursos elegantes, em Timor, as casas são destruídas pelos despejos administrativos e famílias inteiras são atiradas para a rua sem um teto para se protegerem. Enquanto ele coleciona sorrisos em palácios, há cidadãos a morrer sem assistência médica, porque não há hospitais capazes de os salvar. Será esta a fraternidade humana que ele tanto preza?
Esta viagem, como tantas outras, servirá para "fortalecer relações diplomáticas" — ou melhor, para preencher um passaporte com mais carimbos e colecionar mais fotografias para o Facebook. Mas e o povo timorense? Quando receberá um fortalecimento que faça diferença na sua vida real? Quando é que a liderança aprenderá que um país não se governa com discursos internacionais, mas com ação concreta dentro das suas fronteiras?
Senhor Presidente, em vez de discursar sobre fraternidade em salões de luxo, experimente senti-la na pele do povo. Respeite as pessoas, respeite o povo.
O que se espera de um verdadeiro líder é que governe para a nação, para os cidadãos que nele confiaram, e não para os aplausos de uma elite internacional desconectada da realidade de Timor-Leste.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.